05 março 2021
05 mar 2021

Um coração livre

por  Joseph Kuate, scj

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Irmãos e irmãs, chegámos ao III Domingo da Quaresma. No Evangelho, assistimos a uma cena incomum na vida de Jesus. Raramente encontramo-Lo nos evangelhos com raiva e cometendo actos de violência. Ele expulsa do templo os mercadores, derruba as mesas dos cambistas e declara que a casa do seu Pai é casa de oração e não um covil de ladrões. O templo de Jerusalém era, além de local das cerimónias religiosas, o coração económico de Israel. Era ali que se realizava o comércio de importação e exportação e o câmbio de divisas estrangeiras. Era ali que se situava também o grande mercado dos animais para o sacrifício (ovelhas, vacas, pombas…) e a venda de peles de animais que o país exportava em quantidade. Esta dimensão económica tinha adquirido precedência sobre o objectivo específico do templo, como o carateriza Cristo, ou seja, casa de oração. Através deste gesto, Jesus manifesta a rejeição profética e simbólica da centralização do sistema religioso, económico e político do judaísmo.

No entanto, Jesus não se insurge apenas contra este sistema, mas também coloca-se do lado da imensidão de pessoas que eram oprimidas e roubadas pelo sistema. É por isso que Jesus se refere a covil de ladrões. Os mercados estão sempre cheios de traficantes, comerciantes desonestos que exploram vergonhosamente, de bandidos e é perigoso que seja um lugar sagrado a permitir que as suas actividades prosperem. Obviamente, o protesto contra essa estrutura central do judaísmo que Jesus simbolicamente ratifica, ameaça o poder e os privilégios daqueles que dela tiram proveito. Portanto, não é de espantar que a aristocracia sagrada, especialmente os sacerdotes e os escribas que custodiam o templo nas suas mãos, comece a pensar num modo de o fazer desaparecer.

Os judeus pedem-lhe explicações sobre aquilo que ele faz. Consideram o seu gesto escandaloso, mas não se dão conta que o verdadeiro escândalo é o de ter transformado o templo num lugar de tráfico onde acontecem as injustiças. Nas religiões tradicionais africanas, diz-se que os locais sagrados devem estar sempre limpos. Além de varrer, exige-se que esses lugares sagrados sejam também lugares onde os inimigos se reconciliam, lugares onde se transformam as palavras de maldição em palavras de bênção. É uma forma de, como Cristo, retirar dos santuários os objetos de tráfico e de pecado. Jesus escandaliza particularmente os judeus quando lhes pede que destruam o templo para que Ele possa reconstruí-lo em três dias. Jesus faz um anúncio profético. Deste modo, Ele revela que é o novo templo feito, não por mãos humanas, mas edificado por Deus. Esses detractores destruí-lo-ão, conduzindo-o à morte, mas três dias depois Ele voltará à vida. Nós, cristãos, somos o corpo de Cristo, ou seja, este novo templo. Cada um de nós é um elemento na construção deste templo. O tempo da Quaresma é o tempo da purificação do templo. Deixemos que Cristo expulse de nós aquilo que não honra a Deus. Sejamos templo do Espírito Santo, recusando fazer dos nossos corpos lugares de comércio e de tráfico, mas morada de Deus.

A primeira leitura apresenta-nos os dez mandamentos que Deus entrega ao seu povo que acabou de libertar da escravidão dos egípcios. Deixemo-nos libertar por Cristo das várias escravidões, abraçando os mandamentos de Deus. Esses mandamentos fazem da multidão dos escravos um povo consagrado a Deus com as suas leis próprias. Todos esses mandamentos têm como objetivo proibir Israel de escravizar ou de submeter qualquer pessoa à escravidão. Cristo resumirá todos os mandamentos no amor a Deus e no amor ao próximo. Amar significa, então, purificar-se de todo desejo de escravizar o outro e colocar-se ao seu serviço, indo em seu auxílio.

É necessário entregar-se ao serviço até ao dom supremo da vida, como Cristo. É neste Deus que se entrega até ao extremo que nós acreditamos. Ele morreu para nos resgatar. Para os judeus é escândalo e para os pagãos é loucura. Mas para nós, é a sabedoria de Deus que esconde mistérios insondáveis. É irracional, mas a nossa fé confere-lhe a lógica: “o que é tido como loucura de Deus, é mais sábio que os homens, e o que é tido como fraqueza de Deus, é mais forte que os homens”, diz-nos São Paulo (1Cor 1,25).

Não cesses, Senhor, de nos levantar sempre que caímos. Ajuda-nos a expulsar do teu templo que é o nosso corpo todos os actos e os objetos de tráfico de pecado, para que cheguemos à tua ressurreição na Páscoa com o coração purificado de toda a impureza.

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