09 julho 2021
09 jul 2021

Nossa vida espiritual (IV)O princípio e o centro de nossa vida

Nossa vida espiritual (IV)
Apresentação em série do "Guia de Leitura" das Constituições, escrito por P. Albert Bourgeois.
por  P. Albert Bourgeois, scj
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1. Nova et vetera

201  Este princípio é formulado clara e vigorosamente em o n. 17: “Discípulos do Padre Dehon, queremos fazer da nossa união com Cristo, no seu amor pelo Pai e pelos homens, o princípio e o centro da nossa vida”.

202  Este número faz eco ao que é dito em o n. 6 a respeito da intenção específica e originária do Padre Dehon e da índole própria da Congregação: “Ao fundar a Congregação dos Oblatos, Sacerdotes do Coração de Jesus, o P. Dehon quis que os seus membros unissem, de forma explícita, a sua vida religiosa e apostólica à oblação reparadora de Cristo ao Pai pelos homens”.

203  O texto das Constituições de 1885, retomando o texto primitivo de 1877, falava de “consolar o Sagrado Coração de Jesus, reparando as injúrias que lhe são feitas e oferecendo-se a Ele como vítima a seu beneplácito, no espírito de reparação e de amor que é seu caráter distintivo” (n. 1).

204  Mais sobriamente e, agora, mais perto do novo texto, as Constituições latinas (1906-1956) definiam a “vida de amor e de imolação” – “qua Congregatio proprie distinguitur” – como a “melhor maneira de imitar a vida de Jesus Cristo, incessantemente imolada pelos homens” – “vitam Christi pro hominibus continue immolatam imitari” (9).

205  A caminhada é sensível: da “oferenda ao Sagrado Coração de Jesus, para a imitação de sua vida imolada e, em seguida, para “a união em seu amor”. O caráter “cultual” da oferenda, sublinhada, em 1906-1956 – “sacrificium, reparationem, laudem et amorem Domino exhibere intendentes” – reaparece no texto de 1979, em o número 22. Mas a orientação é diferente.

206  Em a nova formulação, a união com Cristo – Cristo-Servidor, Salvador e Senhor, presente em 9-12 – é união com Cristo em seu amor e em sua oblação. Seu amor, descoberto no mistério do Lado Aberto e em sua oblação. Seu amor, descoberto no mistério do Lado Aberto (19-21), é um amor que, “na doação total de si mesmo, recria o homem segundo Deus” (21). Nossa oblação é inserção “com e como Cristo”, “nesse movimento de amor redentor” (21). É uma “diaconia” (serviço). E, como tal, é cultual. É como a diaconia de Jesus na realização de sua missão (cf. Hb 10,5-10) e a de Paulo, no anúncio e no serviço do Evangelho: “Deus, a quem sirvo en meu espírito, anunciando o Evangelho de seu Filho…” (Rom 1,9), “… de ser o ministro de Cristo Jesus para os gentios, a serviço do evangelho de Deus, a fim de que a oblação dos gentios se torne agradável, santificada pelo Espírito Santo” (Rom 15,16).

207  A perspectiva da “oblação” como união com Cristo, não estava, certamente, ausente nem era estranha à intenção primeira do Padre Dehon. Lê-se nas Constituições de 1885: “Não se pode compreender a vocação dos Padres do Coração de Jesus sem vida interior… O caráter próprio da vida interior dos Padres do Coração de Jesus é a união com o divino Coração” (cf. VIII, par. 2, nn. 1 a 3; os textos foram retomados no Diretório Espiritual, VI par. 21.

208  Não seria difícil acumular citações e referências a esta união com o Coração de Cristo, para se viver e agir com e como Ele.

209  Mas esta união “Com” aparece, sobretudo, em função da “vida interior”, na perspectiva da santidade pessoal. O novo texto é bem mais claro e determinante. Sua insistência não deixa dúvidas quanto à sua intenção e orientação. Descobrimos aí um sinal de “atualização”, dentro da linha de “fidelidade dinâmica” à intenção originária do Fundador.

210  A nova perspectiva tem a grande vantagem de caracterizar “nossa oblação” não só como meio de perfeição (imitação), ou como ato de “devoção”, mas como verdadeiro “carisma” que nos habilita a uma missão dentro da Igreja. Porque é união à oblação redentora e reparadora de Cristo, nossa oblação pode ser definida como “carisma profético” (27).

211  A oblação como “união com Cristo em seu amor e em sua oblação” é a fórmula que deve caracterizar a “sequela Christi” dehoniana.

212  O exemplo do Padre Dehon: “Esta adesão a Cristo, nascida do mais íntimo do coração, haveria de realizar-se em toda a sua vida, sobretudo, no apostolado…” (5).

213  Nossa vida religiosa e apostólica:

–   unida “à oblação reparadora de Cristo ao Pai pelos homens” (6),

–   unida a Cristo, no seu amor pelo Pai e pelos homens, o princípio e o centro de nossa vida” (17). E também na disponibilidade e no amor para com todos… que viveremos a nossa união com Cristo…, amando como Ele em obras e em verdade” (18); “Com efeito, somos chamados a inserir-nos nesse movimento de amor redentor, doando-nos aos irmãos, com e como Cristo” (21); “Queremos unir-nos a Cristo presente na vida do mundo e em solidariedade com Ele e com toda a humanidade e a criação inteira, oferecer-nos ao Pai…” (22); “Assim nós entendemos a reparação: … como resposta ao amor de Cristo por nós, como comunhão no seu amor pelo Pai e cooperação com a sua obra redentora…” (23);

–   “A vida reparadora será, por vezes, vivida na oferta dos sofrimentos… como eminente e misteriosa comunhão com os sofrimentos e com a morte de Cristo pela redenção do mundo” (24); “Animando, assim, tudo o que somos, fazemos e sofremos pelo serviço do Evangelho, o nosso amor, pela participação na obra de reconciliação… consagra a humanidade para a Glória e Alegria de Deus” (25).

214  Poder-se-ia continuara pesquisa… 26, 27, 38, 39…

215  A união com Cristo em seu amor pelo Pai e pelos homens (17 e 23) é união com Cristo em sua oblação ao Pai pelos Homens (6,21,22,24), em virtude da natureza do amor, do “ágape”, cuja “presença ativa em nossa vida” experimentamos. Daí a importância de uma séria noção e teologia desta caridade que deve ser fundamento e luz de autêntica vida de amor e de oblação.

2. Dois textos

216  Para caracterizar nossa “experiência e nossa vida espiritual”, o texto remete-nos a duas citações de Sao João:

–   1Jo 4,16: “E nós temos reconhecido o amor de Deus por nós”;

–   Jo 15,4 : “Permanecei em mim, como eu em vós”.

217  Estes dois versículos convidam-nos a meditar seu contexto: 1 Jo 4,7- 21 e Jo 15,1-17. Sem excluir, evidentemente, outros textos possíveis – como Ef 3,17-19 e 5,2 que são explicitamente citados – os dois textos joaninos são ricos de profunda teologia da caridade e da “presença ativa do amor em nossa vida”.

2.1. 1Jo 4,7-21

218  Sem descer a uma análise e a um comentário detalhados da perícope, notemos apenas seu movimento e suas articulações.

219  Fazemos o “conhecimento” e a experiência do amor de Deus, que é amor, (v. 7-8), pela experiência de “Sermos Amados”. Fazemos esta experiência em Jesus e por Jesus, enviado e imolado (v. 9 e 10). Conhecemos, além disso, o amor de Deus, pela experiência de amar. Realizamos esta experiência, amando-nos uns aos outros, pois este amor que vivemos é Deus mesmo que ama em nós e “o seu amor em nós é perfeito” (v. 12) (teteleiomene), ao mesmo tempo, reconhecido, recebido e ativo (v. 11-12).

220  A “caridade” (ágape), além de prática de virtude, é o mistério da própria vida de Deus que vivemos em e por Cristo (v. 16). É uma experiência vivida de “interioridade recíproca”: “Deus em nós e nós Nele”. Este amor que ama “por ações e em verdade” (1Jo 3,16-18) é amor que testemunha e que confessa (v. 13-15); é princípio de confiança e de liberdade (v. 17-18). Age por meio do Espírito que Ele nos deu (1Jo 4,13 e 3,24) e que, segundo S. Paulo, grita em nós “Abba! – Pai!” (Gal 4,6 e Rom 8,15-16).

221  O capítulo 4. da 1a. carta de S. João e, de modo geral, toda a carta, merece meditação atenta, pois é texto-chave da experiência dehoniana: vida de amor contemplativo (9-10), realizando-se no testemunho e no serviço (v 12-15); vida, cuja lei é a da interioridade recíproca (16); vida de oblação filial, pois como Ele (Jesus) é, assim também somos nós neste mundo: Ele foi enviado… a fim de que vivamos por Ele, vítima de expiação por nossos pecados (v. 9-10).

222  O “conhecimento”, ao qual somos chamados, é diferente do que adquirimos pelo estudo. É fruto da própria oblação e cresce na medida de nossa união à oblação do próprio Cristo.

2.2. Jo 15,1-17

223  É a alegoria da “videira”. É texto para ser meditado “com predileção”.

224  Padre Dehon meditava-o e o propunha, com predileção, como a melhor descrição da própria experiência e da experiência SCJ. Apresenta o programa desta “vida de amor”, que é, a seu ver, o tipo da vida espiritual dehoniana (cf. Vie d’amour, meditações 2, 11, 13, 22, 25, aqui S. João 15 é proposto como texto inspirador).

225  O texto deve ser analisado em seu conjunto. A segunda parte (v. 9-17) explica e confirma a primeira (v. 1-8). É o que mostram as repetições de expressões e o nexo que o verso 9 “Permanecei no meu amor” estabelece, unindo as duas paiavras-chave de cada secção.

226  Duas grandes linhas de reflexão podem ser propostas.

227  Teologia do ágape e da “vida de amor”. A alegoria da videira traz a mensagem de comunhão e de comunicação de vida e de fraternidade; v. 9: “Como o Pai me amou, assim também eu vos amei”; v. 12: “Como eu vos amei, amai-vos uns aos outros”. Os exegetas observam que estes dois versículos, como também em outras fórmulas análogas que se encontram em São João, o “Como” (kathôs), possui uma grande força, não somente comparativa, mas causal em relação à caridade trinitária e ao amor cristão. A presença ativa do amor de Deus em Cristo e do Cristo em nós segue a lei e o espírito da interioridade recíproca, formulada nos versículos 4 e 10.

228  Teologia da missão, do “carisma” da vida de amor. O discípulo é chamado para esta vida. Ele é “designado” (v. 15-16), por vocação e carisma, para “produzir frutos”, permanecendo no amor. Em São João, o verbo “permanecer” (menein) tem uma força significativa muito grande.

229  Estes dois textos bem meditados – meditados “com predileção” – ajudam a dar à expressão “princípio e centro de nossa vida”, todo seu alcance teológico, espiritual e apostólico. Segundo este princípio, nosso “seguir a Cristo” não pode ser apenas “imitação de um modelo, fidelidade a um ensinamento ou a um programa. O princípio de toda vida religiosa é, segundo o n. 14 das Constituições, “adesão total e alegre à Pessoa de Jesus”. Para o Padre Dehon era uma “adesão a Cristo, nascida do mais íntimo do coração” (5). Tanto para ele quanto para nós é “união com Cristo, no seu amor pelo Pai e pelos homens” (17). Nosso programa de vida, se tivermos um, não será somente o das Bem-aventuranças e o do Sermão da Montanha. Será também o do Discurso após a Ceia e a Oração de Jesus, no capítulo 17 de São João.

3. Interioridade recíproca

230  A grande lei de nossa vida será a da “interioridade recíproca”, formulada nos dois textos acima. (Ela se encontra também em Jo 6, quando se fala da Eucaristia, e, em Jo 17, como princípio de vida dos discípulos e da Igreja).

231  É tema relevante e particularmente significativo, segundo os exegetas. É lei de experiência espiritual cristã. Ela se encontra também em São Paulo, como em São João, se se der às expressões “a vida em Cristo” e “a vida de Cristo em nós” seu sentido pleno, espiritual e mesmo místico.

232  Quaisquer que sejam os detalhes e as nuanças a serem levados em consideração, esta “lei” está presente no pensamento e na doutrina do Padre Dehon sobre a “vida de amor”. Está presente, também, na descrição feita pelas novas Constituições da experiência dehoniana (2-5) e de nossa vida espiritual (17). É questão apenas de precisar certas características.

233  As Constituições de 1885 falavam de “união com o divino Coração”. Explicitavam e caracterizavam esta “adesão à Pessoa de Cristo” e a “união com Cristo” a partir da abordagem do mistério do “Lado Aberto” e do “Coração Trespassado”. Somos chamados a nos unira Cristo, numa interioridade recíproca” no ato supremo de seu amor e do dom de si mesmo, de sua oblação redentora e reparadora.

234  Ao longo de todo o texto das Constituições, encontrar-se-á, facilmente, a expressão desta união no amor e na oblação: “com e como Cristo” (21), “amar como Ele em obras e em verdade” (18). (Cf. também os números 4, 6, 17, 18, 22, 23, 24, 26, 35). É esta a intenção original do Padre Dehon; é esta a “índole própria do Instituto” (6). A união com a oblação reparadora do Cristo ao Pai pelos homens é o “serviço” que a Congregação é chamada “a prestar à Igreja” (6). É, pois, indispensável uma justa compreensão da natureza desta “oblação”, para que se faça adequada apreciação do que deve ser o “nosso culto ao Coração de Jesus” e do que o texto chama de “nosso carisma profético” “ao serviço da missão salvífica do Povo de Deus no mundo de hoje” (27).

4. Oblação reparadora

4.1. Na vida e nos escritos do Padre Dehon

235  O tema central da “oblação” merece ser estudado e meditado a partir da vida e dos escritos do Padre Dehon e à luz da tradição espiritual da Congregação.

236  Sobre a vida e a formação do Padre Dehon, consultem-se as anotações do tempo de seminário (NQT I-II), sobre a fundação da Congregação, considerem-se, no desenrolar de sua vida em Sao Quintino, os longos anos de espera e de busca de sua vocação e missão (cf. STD n. 9).

237  Para o estudo dos textos oficiais das Constituições de 1885, confira STD n. 2 e os comentários do Padre Dehon a seus noviços (cf. CF V, 82-83).

238  No Diretório Espiritual (I e II partes), encontram-se reflexões sobre a “profissão de imolação” (III, par. 5) e as virtudes próprias de nossa vocação (VI parte, par. 19, 20, 21).

239  Com efeito, a oblação está presente em toda parte. E é em função da oblação que virtudes, exercícios e práticas são recomendados. Apesar das aparências e das expressões que, às vezes, possam parecer minimizadoras ou fora de moda, esta vida de oblação, exigente, sem dúvida, tem sua profundidade doutrinal.

240  As novas Constituições, caracterizando, com insistência, nossa oblação como “união com a oblação do Cristo” indicaram e precisaram, para nós, o caminho da fidelidade dinâmica em vista da atualização de nossa oblação, como princípio unificador de nossa vida religiosa e apostólica.

241  Tudo isso está na linha da teologia da caridade que não é apenas virtude para praticar, “a mais eminente virtude” segundo a expressão do Diretorio Espiritual (I, par. 1), mas é a própria vida de Deus, o mistério de Deus para se reconhecer e acolher e nele entrar. É o mistério da oblação: Deus ama, doando e se doando; o Verbo ama, encarnando-se; e Cristo, habitando entre nós, vivendo e morrendo por nós. É próprio do amor dar e dar-se. E isto é oblação.

4.2. Oblação filial e reparadora

242  A oblação interessa e compromete nosso ser de homens e de cristãos, em sua relação com Deus, nosso Criador e Pai, por e em Jesus Cristo.

243  Oblação essencial da criatura a seu Criador. É a oblação da imagem que busca sua semelhança; oblação que é “princípio e fundamento”, segundo Sto Inácio, “da indiferença”, entendida como disponibilidade a Deus e ação positiva; é escolha para responder mais plenamente ao amor e se entregar a seu serviço, de acordo com a finalidade para a qual fomos criados.

244  Oblação filial. Cristo, Verbo e Filho encarnado, Imagem do Deus invisível e Primogénito de toda criatura (Col 1,15) é a imagem original e exemplar. Nele o Pai “nos predestinou para sermos seus filhos adotivos por Jesus Cristo” (Ef 1,4-6). Nossa oblação, além de dever a ser cumprido, é exigência de nosso ser cristão, chamado a tornar-se o que Ele é: um filho que vive plenamente a exigência do amor filial.

245  Oblação redentora e reparadora. Em união com a oblação do Coração trespassado do Salvador, nós nos abrimos, nele e por seu sangue, a toda sabedoria e inteligência (cf. Ef 1,3-4). Nossa oblação é, em nós, fruto do Espírito. O Espírito de Cristo grita em nós: “Abba! Pai!… Pai, que tua vontade seja feita!… “ “Ecce venio”! É oblação de amor filial de amor redentor e reparador, até a imolação do sacrifício. Ela realiza já em nós e para os outros, na Igreja e no mundo, o desígnio misericordioso do Pai, reunindo o universo sob um só chefe, o Cristo.

246  Estas perspectivas, que são as de Ef 1,3-14, encontram-se, aqui e ali, nas três primeiras meditações da “Couronnes d’amour” (I, 1. mistério, meditação I, 2,3). Isto faz parte, diz o texto, das “primeiras bases de nosso amor ao Sagrado Coração”. Assim entendida, nossa oblação não é questão de fórmulas piedosas nem de conveniências pessoais. Ela se impõe a todos nós em nome do que há de mais fundamental na revelação. É exigência de vida, imposta pela própria força do amor, pela força do Espírito que age em nós e nos assemelha a Jesus Cristo em seu amor pelo Pai e pelos homens. Não é “exercício” de piedade, mas princípio de vida, de toda a vida: orações, trabalhos, alegrias (cf. n. 7). Ela determina “nosso ideal espiritual” e o “testemunho profético” a que somos chamados a dar na Igreja e no mundo de hoje.

4.3. Em sacrifício… pe lo pecado

247  Nossa oblação é reparadora: união com Cristo em seu “amor menosprezado”, para “reparar o pecado e a falta de amor na Igreja e no mundo” (7). Para nós, como para o Padre Dehon, a compreensão da reparação e do caráter reparador de nossa oblação depende de nossa “sensibilidade ao pecado” (cf. 4) e “ao que, no mundo de hoje, constitui obstáculo ao amor de Cristo” (29).

248  A oblação de Cristo é oblação do Filho de Deus “feito pecado por causa de nós” (2Cor 5,21). Nossa oblação é a de filhos “implicados no pecado” (22) que vivem em solidariedade com Cristo, feito pecado e com a humanidade pecadora da qual somos membros. Em virtude desta dupla solidariedade, nossa oblação é redentora e reparadora.

249  É necessário aprofundar esta reflexão, se não se quiser cair no perigo de reduzir a oblação, “participação na graça redentora”, à pura abstração ou a uma fórmula generosa e piedosa. A “oferenda viva, santa e agradável a Deus” é, antes de tudo e necessariamente, um Sacrifício.

250  A palavra “Thusia” aparece na citação de Ef 5,2, junto com “oferenda” (prophora). Ela deve ser bem entendida. Não tem somente sentido moral e ascético (mortificação-sacrifício) mas verdadeiro sentido teológico. Padre Dehon referia-se, de bom grado, à teologia do sacrifício, segundo a Escola Francesa (P. de Condren).

251  O Diretório Espiritual III, V, par. 1 dá definições de sacrifício, de vítima, de oblação e de imolação-destruição. Ele gosta de sublinhar, quando fala da oblação, que se trata de “imolação”, de oblação “em espírito de imolação” (de vítima). O título do capítulo II das antigas Constituições era “De spiritu amoris et immolationis”. Ele consagra um de seus Avisos e Conselhos (IV) “ao espírito de vítima em união com o Coração de Jesus”.

252  A referência ao Lado Aberto e o culto ao Coração de Jesus, segundo Paray-le-Monial, estão na mesma linha. Quaisquer sejam os termos empregados, não se pode desconhecer esta dimensão sacrifical da oblação reparadora. O n. 24 das novas Constituições sublinha isto explicitamente, citando o famoso texto de Col 1,24.

253  Padre Dehon, porém, não se refere ao sacrifício – destruição da Escola francesa (o texto do Diretório Espiritual, edição 1908, é, de fato, do P. Prévot).

254  A imolação dehoniana é a oblação de amor “usque ad finem”, como a de Jesus.

255  Nossa oblação é união com a oblação de Cristo “que se entregou” (Gal 2,20; Ef 5,2), “que dá sua vida” (Jo 15,13), “como vítima de expiação” (1 Jo 4,10). O “Ecce venio” remete-nos para a carta aos Hebreus. É a carta do sacerdócio e do sacrifício de Cristo. Ela convida-nos a manter os “olhos fixos naquele que é o autor e o realizador da fé, Jesus” (Heb 12,2). A exemplo do Padre Dehon, nossa vida presente na carne, devemos vivê-la “pela fé no Filho de Deus, que nos amou e se entregou a si mesmo” por nós (Gal 2,20). As citações e as referências, ao longo do texto das Constituições sublinham esta dimensão sacrifical da oblação: Gal 2,20 (12); Mc 10,45 (10); 1Pd 2,21 (19); Heb 5,19 (19); 1Jo 3,16 (21) ; Ef 5,2 (22); Col 1,24 (24).

256  Nossa oblação, “nesse movimento de amor redentor” (22), é “cooperação com… a obra redentora” (23), “participação na obra de reconciliação” (25), “ao serviço da missão salvífica do Povo de Deus no mundo de hoje” (27). Em nossa oblação, como na de Jesus, se enraíza nossa “missão”. É por isso que ela é reparadora e redentora. A oblação sacrifical de São Paulo, seu “sacrifício espiritual” é, antes e acima de tudo, sua vida de apóstolo (cf. Rom 1,9 e 15,16). Nós também vivemos nosso “carisma profético”, no “ideal espiritual” que orienta “nossa participação na missão da Igreja”, em espírito de amor e de reparação – “culto de amor e de reparação ao Coração de Jesus” – como um “sacrifício.

257  Mutuae Relationes recorda-nos que é uma constante histórica “a ligação entre carisma e cruz” (n. 12).

5. Os “caminhos” da união

258  “Perseverando na escuta da Palavra e na partilha do Pao…” (17).

259  Os “caminhos” de união sao os do “conhecimento”: “conhecer o amor de Cristo que excede a todo conhecimento”, segundo Ef 3,19, citado em 17 das Constituições.

260  Referindo-se a este texto, o n. 17 fala de “descobrir, cada vez mais, a Pessoa de Cristo e o mistério do seu Coração e a anunciar o seu amor que excede todo conhecimento” (17).

261  É evidente a intenção de sublinhar a perspectiva profética e apostólica desta descoberta e deste “conhecimento”. Aliás esta interpretação está de acordo com o contexto do versículo de Paulo, que fala aqui como “ministro da graça”. “Esta graça de anunciar aos gentios a insondável riqueza de Cristo e de pôr em luz a dispensação do mistério oculto desde os séculos em Deus” (Ef 3,7-9).

262  As novas Constituições indicam vários “caminhos” de “união com Cristo em seu amor e em sua oblação” – “princípio e centro de nossa vida” (17).

263  Escuta e meditação da palavra – Este tema do n. 17 será desenvolvido e explicitado ainda mais em os números 76-79. “Contemplamos o amor de Cristo nos mistérios de sua vida – (principalmente no mistério do Lado Aberto, segundo o n. 21) – e na vida dos homens (procurando os sinais de sua presença (23) e atentos aos apelos que o Pai nos dirige… (35).

264  Este caminho de contemplação faz-nos progredir no conhecimento de Jesus (cf. 78), deixando-nos renovar na intimidade com o Cristo e unir-nos ao seu amor pelos homens (cf. 79).

265  Somos convidados a perseverar na oração (cf. 76), a reservar momentos de silêncio e de solidão (cf. 79). Disto depende a fidelidade de cada um e das comunidades, bem como a fecundidade do nosso apostolado (cf. 76).

266  Partilha do Pão – Muito importante, este tema será desenvolvido em os números 80 a 84.

267  É a fonte e o ponto culminante de toda a vida cristã e religiosa (cf. 8). É sacrifício em que nos unimos à “oblação perfeita que Cristo ofereceu ao Pai” (81); é o sacramento de sua presença. Nele queremos aprofundar “a nossa união ao sacrifício de Cristo” (83) e “responder ao convite de encontro e de comunhão que Cristo nos faz com este sinal privilegiado de sua presença” (84).

268  O sofrimento – “Eminente e misteriosa comunhão com os sofrimentos e com a morte de Cristo” (24).

269  O serviço dos irmãos – É a disponibilidade de amor em que “viveremos a nossa união com Cristo” (18) e nossa comunhão “com Cristo, presente na vida do mundo” (22), “em solidariedade efetiva com os homens, a exemplo de Cristo” (29), “com e como Ele” (21)[1].

[1] Em seu comentário aos primeiros capítulos das Constituições, P. Carminati SCJ, propõe e ilustra, de maneira muito sugestiva, os cinco caminhos de acesso à união com o Divino Coração de Jesus (cf. o.c., pp. 36-37).

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